A compreensão de Jesus como Bom
Pastor marcou fortemente os discípulos das primeiras comunidades cristãs, a tal
ponto de ser esta a primeira e mais antiga imagem de Jesus, pintada na
sepultura de um cristão do primeiro século, em Roma, nas catacumbas de São Calixto.
Não era o Senhor crucificado, nem mesmo ressuscitado, era o jovem Jesus com uma
ovelha nos ombros: o Bom Pastor.
Todos os anos, o IV Domingo da
Páscoa é dedicado a esta marcante figura. É o Domingo do Bom Pastor e Dia
mundial de oração pelas vocações.
O evangelho proclamado (Jo 10,11-18)
apresenta-nos duas característica marcantes que nos fazer identificar o Bom
Pastor:
a)
Ele conhece as suas ovelhas e elas o conhecem (Jo
10,14b) e
b)
Ele dá a vida pelas suas ovelhas (Jo 10,11b).
É consolador saber que nós,
ovelhas do rebanho de Cristo, somos por ele conhecidas. Ele chama-nos pelo
nome, conhece a cada um de nós, sabe das nossas mazelas, feridas, necessidades
e também virtudes, capacidades etc. O Bom Pastor conhece as suas ovelhas. Mas,
há nesta primeira característica um outro detalhe que toca-nos diretamente: as
suas ovelhas o conhecem. Será que somos nós essas ovelhas que conhecem o Bom
Pastor? Será que podemos dizer com segurança que conhecemos a Jesus Cristo?
Olhando para a experiência do
convívio entre o pastor e suas ovelhas percebe-se que há algo que é prioritário
no conhecimento do pastor pelas suas ovelhas. Elas conhecem, antes de tudo, a
sua voz. A voz do Pastor é a guia inconfundível das ovelhas. As ovelhas são
guiadas pela audição. Ao ouvir várias vozes, as ovelhas sabem exatamente e sem
titubear qual é e pra onde conduz a voz do seu pastor. Será que nós conhecemos
a voz de Cristo? Será que, em meio a tantas vozes, reconhecemos qual é e pra
onde nos guia a voz do Bom Pastor?
Creio que ainda temos uma longa
tarefa pela frente: afinar os nossos ouvidos à voz do único Bom Pastor, Jesus
Cristo. Precisamos, num mundo tão cheio de vozes a querer confundir as ovelhas
de Cristo, ter segurança da voz do pastor, saber reconhecê-la no meio da
multidão e saber com clareza pra onde ela nos guia. Nesta tarefa, penso que duas
atitudes podem nos ajudar a afinar nossos ouvidos à voz do Pastor:
a)
Intimidade
com a Palavra: é preciso conhecer a Palavra de Deus, a
Bíblia; criar intimidade com ela, fazer dela nossa companhia cotidiana na leitura,
meditação, oração e contemplação, nos círculos bíblicos, na audição atenta da
Palavra na missa cotidiana etc. Sabendo o que diz o Bom Pastor, saberemos
quando ele nos diz. Conhecendo o que ele diz, reconhecermos inconfundivelmente a
sua voz;
b)
Silêncio: num
mundo de tanto barulho, de tantas imagens, de tantas vozes a solicitar a nossa
atenção, faz-se necessário o silêncio. Silêncio exterior (da boca e dos
ouvidos), sim, pois ele é necessário, mas sobretudo silêncio interior (do
coação, da alma), ao qual nos conduz o silêncio exterior. O profeta Elias nos
alerta que Deus passa na brisa suave e não no trovão ou na tempestade (cf. 1Rs
19,11). Se não houver em nós o silêncio, Deus passará e nós sequer ouviremos a
sua voz, porque “ele não grita, nem levanta a voz” (Is 42,2).
A segunda característica é que
o Bom Pastor dá a vida pelas suas ovelhas. Não tira-lhes a vida, mas dá a sua
vida para que elas tenham vida. Ao contrário do mercenário que as abandona e
deixa-as à merce do lobo. De novo reconhecemos indubitavelmente a Jesus Cristo
como nosso Bom Pastor, pois ele deu a sua vida por nós. “A pedra que os
construtores rejeitaram tornou-se pedra angular” (Sl 117(118), 22).
A pedra angular é aquela que se
encaixa perfeitamente no cimo do arco pleno, típico dos romanos, e ali colocada
dá segurança, sustento ao arco que permanece inabalável, desde que não se
retire a pedra angular, o que faz com que todo o arco venha abaixo.
Jesus, rejeitado pelos homens,
tornou-se o fundamento da nossa salvação. Sem ele, o arco da história humana
não se sustenta, não fica de pé, pois se vivemos é por ele que vivemos, pois
ele morreu quando nós deveríamos morrer e morreríamos pelo pecado. Se ele não
tivesse dado a sua vida por nós, nós não estaríamos vivos, aqui, para compor o
arco da nossa história, história de salvação. E nessa história fomos por ele,
pelo Filho, tornados filhos. É assim que ele nos salva, inserindo-nos por sua
graça na sua filiação divina. Somos “filhos no filho” (cf. Ef 1,5). “Vede que
grande presente de amor o Pai nos deu: de sermos chamados filhos de Deus! E nós
o somos!” (1Jo 3,1 ). Somos filhos de Deus porque participantes, pelo Batismo e
pelos outros sacramentos no seu mistério Pascal, na entrega da sua vida por
nós.
Portanto, irmãos caríssimos,
empenhemo-nos em conhecer o Bom Pastor e sua voz que nos conduz “às verdes
pastagens” (Sl 22,2) e vivamos com ele na entrega da nossa vida, na doação,
vencendo todo egoísmo e egocentrismo, para assim, participarmos ainda mais do
seu Mistério Pascal.
Muito bom padre Jean, é muito bom mesmo de longe saber um pouco através das suas sábias palavras...
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